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O MEU VIZINHO - PARTE I

Atualizado: 16 de dez. de 2020


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Apenas sei o primeiro nome dele, chama-se Dinis e vive no mesmo piso que eu e justamente no apartamento em frente ao meu. Poucas vezes nos cruzamos pois os horários de ambos são desfasados. Aliás, nunca fui muito de me relacionar com a vizinhança, gosto muito do meu espaço e de o partilhar com o meu gato “Simba” e que é a minha melhor companhia. Mas naquele dia, estranhamente saímos do apartamento ao mesmo tempo e o “Simba” veio logo tentar perceber a origem do barulho. Guarda-chuva numa mão, carteira na outra, mala do portátil e a chave para trancar a porta, foi uma combinação que exigiu algum equilíbrio da minha parte.

- Bom dia. – Disse um pouco sem jeito, dada a quantidade de coisas que me envolvia, mas que soava a um bom dia contido.

- Bom dia. Posso ajudar? – Diz ele muito solícito, fixando o olhar no gato que se roça nas minhas meias.

- Simba, para dentro. – Digo ajeitando o vestido preto coberto com um casaco vermelho. Hoje a reunião de trabalho exigia que a indumentária fosse esta. E ele obedeceu, enquanto eu entreguei a mala do computador e o meu guarda-chuva ao meu vizinho da frente. Reparei que estava em fato de treino e sorri, quando finalmente me viro de costas e fecho a porta de casa, virando-me para ele. – Obrigada. Tenho o péssimo hábito de trazer tudo ao mesmo tempo e depois acontece isto. - Disse, desculpado-me.

- Tenho tempo, por isso, ainda bem que nos cruzamos. Vou correr um pouco e depois regresso, tenho uma tarde repleta de reuniões de trabalho e preciso de libertar energia. - Confessou.

E fomos caminhando na direção do elevador. Apesar de ser um prédio com apenas 2 andares, havia um elevador que percorria o edifício desde a garagem até ao nosso piso, que por sinal era o último. Entramos dentro do elevador e rapidamente me aproximei dele, aproveitando para carregar no botão que me levaria à garagem. O perfume, a presença, a proximidade e tinha de sair dali...

- Obrigada. Acho que agora, sem o Simba a roçar as minhas pernas e sem ter uma porta para fechar, consigo levar as minhas coisas. – Digo, pegando apressadamente, na minha mala do PC e no guarda-chuva, mas tocar na pele dele ao passar-me as minhas coisas foi inevitável. Levanto o olhar na direção dele e vi o mesmo, o toque não foi indiferente. – Hoje também tenho uma reunião, mas vai ser longa e só devo chegar a meio da tarde a casa. O resto do trabalho tenho de o fazer no PC, mas já em casa.

- Entre reuniões, estou tentado a convidá-la para um café, se não estiver muito ocupada, perto do fim da tarde…. – Disse não fazendo sequer uma pergunta, mas deixando em aberto a possibilidade.

- Estou tentada a aceitar. Será uma forma de desligar do longo dia. – Digo com sinceridade.

- Então isso é um sim? – Perguntou ele.

- Sim, bata à minha porta e vou ter consigo. – Digo eu quando o elevador pára no piso correspondente à garagem e eu saio, despedindo-me com um vago acenar, sem olhar para trás, mas sabendo que o meu movimento é seguido.

- Assim farei. Até logo. – Diz ele e o elevador entretanto fecha-se e rapidamente alcanço o meu carro e dirijo-me às instalações da editora.

E mesmo estando uma dia cinzento, com chuva e vento a adornar, mas nem isso me impede de sorrir, quando entro dentro do edifício da editora onde me aguardam.

A reunião foi mais breve do que imaginava e pouco depois das 15 horas já estava de regresso a casa. Fiz questão de fazer algum barulho a entrar em casa, pois sabia que seria uma garantia de ser ouvida na porta em frente e só depois entrei e fui, recebida, uma vez mais pelo habitual e familiar roçar e ronronar do meu gato.

- Olá Simba. Já cá estou… - E fechei a porta atrás de mim.

Não tardou muito que o som da campainha ecoasse pelo apartamento e que, apesar de não ser muito grande, tinha sido desenhado à minha medida. Demorei-me, propositadamente e depois, fui até à porta e finjo um ar surpreso. - Na tua casa ou na minha? - Pergunta ele sem me dar tempo sequer de recuperar quando o meu olhar o percorre, de cima a baixo, jeans um pouco justos e uma camisa azul por fora das calças. Os ténis que calça dão o toque final e o cabelo meio desalinhado ainda me deixa mais perdida. - Depende do que tiveres para oferecer... - Digo lançando a primeira flecha. - Queres descobrir? - Perguntou ele, sem grandes rodeios. - Gostava, mas com esta chuva preciso de algo quente, doce... - Vem. Deixa-me surpreender-te. - Diz e fico petrificada, pois estou cada vez menos adepta de surpresas, coisas que me fogem do controlo. E apenas volto atrás para ir buscar o telemóvel e olho para o Simba que miou para mim, como que antecipando o pecado que estava para vir.

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