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ORIGINAL SIN - PARTE II

Atualizado: 9 de ago. de 2020


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Saí dali, apressada, só parando no meu Fiat 500, completamente a arfar e vi as quase 1000 chamadas não atendidas que a Paula me tinha feito. Mas eu recusava-me terminantemente a falar com ela naquele momento, pois sei que me notaria alterada e era a última coisa que eu pretendia. Entrei no carro e rumei a casa...precisava de um lugar seguro e tranquilo, mas o telefone não parava de tocar e eu não podia continuar a ignorar as chamadas dela.

- Estou a conduzir, por isso se me ouvires mal ou algo parecer estranho é por causa disso. - Justifiquei-me por antecipação.

- Conta como foi? Gostaste? - Perguntou-me.

E tentei descrever a coisa mais enfadonha possível de forma a passar despercebida.

- Sim, mas praticamente só ficamos a conhecer-nos todos...e contamos aquelas coisas todas que é normal dizer numa primeira aula. Porque estão aqui? Motivações? Etc....

- E? - Queria saber mais, merda.

- E amanhã parece que vou de novo. Quantas horas são mesmo?

- Julgo que 60h...15h por semana. - Disse ela por fim.

- Bem estou a chegar a casa e preciso de um banho. Falamos depois. - E felizmente o telefonema terminou e não deu aso a grandes dúvidas.

E o dia passou a correr e eu não conseguia deixar de pensar nele...no chefe que começou por ser um mero estranho no elevador e que me ouviu dizer as maiores barbaridades da aula que ele ia dar.

E adormeci ciente que no dia seguinte, me aguardava uma nova aula, contava eu que fosse mais prática para que a não houvesse tanta proximidade e troca de ideias como tinha acontecido na primeira aula.

Cheguei quase em cima da hora e ia a entrar no elevador do prédio quando ele volta a entrar. Não o olho logo, mas reconheço-o pelo perfume. Encosto-me ao espelho e sinto o contraste do frio do espelho sobre as minhas costas nuas. Escolhera um top de alças que apertava no pescoço e as mesmas jeans…e as sandálias vermelhas, da mesma cor do top…uma pequena pasta com caderno para anotações e estojo e uma pequena carteira azul e vermelha.

- Qual o andar? – Perguntou ele a sorrir quando encontra o meu olhar.

- Porque não me disse logo quem era e evitava que fizesse aquela figura parva? – Perguntei simulando um amuo não sentido.

- Porque de outra forma não ficaria a saber a verdade, Eva. – Confessou ele e quando diz o meu nome estremeço.

- Está com frio? – Perguntou-me ele reparando nos mamilos que se notavam pelo top acetinado que escolhera.

- Não. – E olhei para o top e percebi que os mamilos sobressaiam por baixo do top, endurecidos pela excitação que subitamente estava sentir. E instintivamente virei-me de costas e sinto que o elevador pára. – Que aconteceu? – Perguntei, virando-me para a porta.

- Parei o elevador…se se sente desconfortável como está não faz sentido sairmos assim. – Diz e por momentos aquele gesto nobre, faz-me sentir especial.

- Não sei se… - E não consegui terminar a frase.

- Se quer voltar a não reagir a mim? – Perguntou-me diretamente.

- Como se atreve? Nem me conhece de lado nenhum para fazer insinuações dessas. A verdade é que está mais frio aqui dentro e sou muito sensível a diferenças de temperatura. – Menti, estando quase a ponto de querer partir o espelho atrás de mim, de tão furiosa que estava por aquele comentário. E carreguei no botão. – Não tenho qualquer problema em que reparem nos meus mamilos, sempre dei nas vistas por os exibir de forma perfeita…não seria agora que iria sentir pudor por isso suceder. – Disse de forma convicta.

E tínhamos chegado ao 8º andar e saí primeiro sem olhar para trás, percebendo claramente que o chefe me olhava enquanto caminhava e parei, de propósito e olhei para trás…e ele olhava-me, tal como eu previa.

- A aula hoje vai ser de quê? – Perguntei apanhando-o a olhar-me…perdido.

- Vamos fazer uma introdução à culinária, mas focar-nos nos molhos… - Disse, sendo agora ele a ficar atrapalhado.

- Não é crime lamber se o molho for bom? – Perguntei…

- Crime é não saborear…não sentir…e quase me arrisco a dizer: partilhar também. – Diz ele filosoficamente.

- Vou chamá-lo para me lamber um dos dedos quando fizer um dos molhos…aceita? – Perguntei de forma indecente.

- Aceito…assim como o Adão aceitou dar um simples dentada na maçã. – E alcançou-me, dando comigo entrada na sala, mas cada um seguindo o seu curso. Ele para a bancada da frente e eu para a que tinha ocupado no dia anterior.

- Bom dia a todos e a todas. Hoje vamos começar por algo que, apesar de básico na cozinha, é o que lhe dá o toque de genialidade…os molhos. – Começou. – Os molhos são considerados uma das melhores provas de talento de um profissional e, por vezes, até podem ser a solução de última hora para remediar um prato. É sobretudo a percepção das nuances das combinações dos sabores com os alimentos que distinguem um profissional de um amador. E a primeira pergunta que me assiste perguntar-vos é a mais elementar, mas necessária para a próxima fase. O que é um molho? – Perguntou ele a todos.

Eu optei pelo silêncio, aquela mistura de combinações e sabores estava a deixar-me fascinada. E, de alguma forma, todos dando os contributos certos para a resposta que ele pretendia.

- Do que fui percebendo todos vocês tem a mesma noção do que é o molho, mas vamos a algo mais técnico…e histórico também. – E atrás dele surge uma tela que vai descendo e ele começa a falar do mais básico….

- A definição de molho…tão somente o líquido que adiciona sabor, humidade, dá aparência e ajusta o sabor e a textura dos pratos que preparamos. Pode ser quente, frio, doce, salgado, liso ou com pedaços. A etimologia da palavra molho, alguém sabe dizer-me qual é? – Perguntou e eu contorci-me, no banco, pois sabia a resposta.

- Sim, Eva. Quer partilhar algo connosco? – Perguntou ele, percebendo que eu queria falar.

- Sim, por acaso quero…sei que a palavra molho deriva do latim salsus que significa salgado e advém da necessidade de salgar, temperar um alimento de forma homogénea. – Disse e o meu olhar continuou fixo nele.

- Corretíssimo. Mas com o tempo o molho passou apenas a humedecer, a complementar as preparações, chegando mesmo a ser mais importante que o próprio alimento, daí a importância da aula de hoje. E depois continuou a falar dos aspectos mais importantes a considerar para um bom molho: sabor, riqueza (a quantidade de proteínas e sal que pode ter), humidade e especto, passando depois a questões mais técnicas de alguns pontos prévios para conceber um bom molho: equipamentos, espessantes, recipientes, temperos…e depois de alguma base histórica que foi desde o clássico Antoine Carême, o grande responsável pela criação da classificação dos molhos até aos contemporâneos, falamos dos molhos base, aqueles a partir dos quais todo se elaboram, atendendo aos ingredientes que se adicionam.

-Alguém me sabe dizer pelo menos um molho base na cozinha? – Perguntou para a classe.

- Sim, provavelmente o bechamel será um desses molhos. – Disse alguém atrás de mim.

- Muito bem, mais alguém sabe de outro? – Mas a pergunta deu lugar a um silêncio e um novo slide foi exibido e o chefe foi percorrendo a sala até parar de novo na minha bancada e começar a detalhar cada um dos molhos base. E entre o holandês, o bechamel e o espanhol…fui tomando notas, ignorando a presença dele ali.

Depois desta pequena explicação teórica, distribuiu aleatoriamente pelas mesas uma folha que descriminava um molho…

- Vou querer que o elaborem, com os ingredientes que se encontram nestas prateleiras. – Disse apontando para as prateleiras de um e de outro lado da sala.

E de mesa em mesa, ele foi percebendo a facilidade ou dificuldade de cada um e ajustando o que considerava ser necessário corrigir. Quando chegou a mim…

- Molho bechamel…Eva…à base de leite…para mim… - As minhas faces ruborizaram de imediato, mas não cedi logo, apesar de o meu corpo me denunciar…

- Textura cremosa e sabor suave….tem um sabor neutro. A base é leite, leva farinha, noz moscada, sal e pimenta q.b….e no fim deve ter uma coloração semelhante à que preparei…brilhante e ligeiramente marfim. – Disse eu, tentando mostrar que tinha aprendido bem a lição.


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- Já provou? – Perguntou-me ele.

- Não. – Respondi prontamente.

- Então como sabe que está bom? – Perguntou-me.

- Coloquei todos os ingredientes…e tem o aspecto que o bechamel tem. – Respondi assim apenas para não dar parte fraca, mas sabendo que deveria ter provado.

- Vamos provar… - Disse ele aproximando-se de mim.

- Como? – Perguntei.

- Levante a colher e passe o dedo e lamba. – E fiz o que me pediu e todo o meu corpo estremeceu…estava delicioso. – Hmmm…gosto.

- Vou comprovar. – E repetiu o gesto, mas foi no meu dedo que pegou e levou-o à boca para lamber depois de se certificar que todos estavam compenetrados em terminar o ponto dos molhos. – De facto está delicioso….sabe a leite…sabe…bem…

- Enquanto os meus colegas terminam posso ir à casa de banho? – Pergunto, tentando quebrar aquele ambiente que me está a deixar tensa e excitada.

- Sim…claro. – E nesse momento saí da sala e dirigi-me à casa de banho que ficava mesmo em frente da sala e quando me olhei ao espelho da casa de banho feminina, vi no reflexo do espelho a imagem dele.

- Porque me seguiu até aqui? – Perguntei furiosa.

E preparava-me para passar por ele para ir até à casa de banho quando ele me travou e pegou num dos meus dedos e o levou à boca e voltou a lamber…demoradamente.

- A tua pele tem a textura e o sabor certo para combinarem na perfeição com os molhos. Posso experimentar os molhos no teu corpo depois da aula? – Perguntou-me.

Ia negar e pregar-lhe um estalo, mas pensei duas vezes e apenas tive coragem de lhe dizer…

- Terá de escolher bem…não sei se qualquer molho combina comigo…

- Eu avaliarei…

E dizendo isto deixou-me na casa de banho e pouco depois regressei à aula e todos tínhamos ficado a perceber tudo o que era preciso sobre molhos e como os elaborar e conjugar com os pratos.

- Hoje ficamos por aqui, até daqui a dois dias. – Disse, precisamente por a última aula da semana ser apenas dois dias depois.

Fiquei propositadamente para trás, tentando nem ser rápida ou lenta demais.

- Eva, preciso de falar consigo. Não se vá embora. – Diz ele para mim, ainda com alguns presentes na sala, de forma a travar qualquer tentativa de eu fugir.

- Sim chefe, já irei ao seu encontro. – E quase parecia uma submissa a falar para o seu dominador. E não seria de facto assim?

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